sábado, 29 de maio de 2010

Falcão

Falcão-Meninos do tráfico,

Documentário produzido pelo MV Bill e Celso Athayde

Em Falcão meninos do tráfico, podemos ver cenas que no mínimo são tristes e revoltantes, ao mesmo tempo.
Como pode uma criança de 11 anos de idade segurar um fuzil, para proteger e vigiar pontos de drogas?
Qual o motivo, qual a razão para ele fazer isso?
É essa a visão, a perspectiva, o fio condutor do documentário, não é julgá-los e discriminá-los como muitos fazem,
mas sim mostrar o que aconteceu para estarem vivendo desta maneira.
O longa metragem foi produzido entre os anos de 1998 e 2006, já estamos em 2010 e o que mudou? Quase nada...
Digo quase nada, pois este documentário, fez com que algumas pessoas mudassem o seu ponto de vista em relação a estas crianças,
que são vítimas da sociedade hipócrita e capitalista em que vivemos.
E os nossos governantes, fazem o que para mudar essa realidade?
Sinto a obrigação de compartilhar a entrevista que encontrei no site Conexão Brasil Hip Hop, em que o MV Bill,
fala sobre seu documentário, que logo após se tornou livro, segue abaixo a reprodução da entrevista:

“COMO SURGIU A IDEIA DO DOCUMENTÁRIO?


MV BILL - Quando começamos nossa pesquisa, entre 97 e 98, vi muita coisa acontecendo com os jovens.
Daí surgiu a letra de Soldado do Morro (do CD Traficando
Informação, de 1999). Eu chamei o Celso Athayde para fazer o videoclip e
entrevistamos vários garotos. Quando voltamos lá algum tempo depois, 80% dos
jovens estavam mortos. Aí eu percebi que a música e o vídeo eram importantes, mas
insuficientes para interferir na realidade.
Então, começamos a filmar os garotos das comunidades das cidades onde íamos fazer os
shows. Fomos identificando jovens que viam na criminalidade uma maneira de vida. A
coisa foi acontecendo. Talvez seja a única oportunidade de retratar esses jovens de
outra maneira, com outros olhos. Falar com eles e mostrá-los de uma maneira mais
humana.

O QUE MAIS TE IMPRESSIONOU?

MB - Escolhemos 17 jovens como fio condutor do documentário. As falas deles
eram muito ricas, sobre os sonhos, a vida, a família, o futuro. Disseram coisas que
nunca tiveram oportunidade de dizer para outras câmeras. Percebi que, mesmo a droga,
que é a tragédia de tantas vidas, é a sobrevivência de tantas outras. Fomos
acompanhando o que acontecia com eles.
Dezesseis morreram no espaço de dois anos.
As mães deles, na hora mais difícil, ligavam para a gente dizendo “meu filho
morreu, venham filmar, porque ele acreditava que o trabalho de vocês era importante”.
O filme era para falar sobre a vida dos meninos. Acabou falando sobre a morte.
Quando soube que o último sobrevivente havia sido preso, agradeci a Deus pela
prisão. Era uma forma de garantir a vida dele.

SUA EXPERIÊNCIA DE INFÂNCIA NA FAVELA INFLUENCIOU NA PROPOSTA
DO DOCUMENTÁRIO?
MB - O fato de morar na Cidade de Deus, ser nascido e criado lá, faz com que enxergue as coisas diferente. Não consigo ver como bandido quem brincou comigo quando era criança.
Todos os meus amigos de infância estão mortos. Os que estão vivos são cadáveres ambulantes. Tive uma infância padrão para quem nasce em comunidade. Estudar até onde der. Conciliar estudo e trabalho. Uma hora tem que optar porque fica muito difícil. Na favela tem o que chamo de sonhos adiados. Descobri que o tráfico, de forma trágica, dá respeito, visibilidade. Andar com uma arma na favela impõe respeito. Todo mundo quer ser visível. Encontrei a música, mas ela não é o único caminho. É um dos caminhos.
Não tem o mesmo caminho para todos. Procurei retratar isso nas músicas. Quando
criamos a CUFA, tivemos a oportunidade de praticar o discurso. O projeto todo pratica.
Conversar com as pessoas, mostrar a realidade. Não só cantar. Falo e brigo por
interesses de outras pessoas. Porque, geralmente, as pessoas que ficam famosas e
têm espaço na mídia acham difícil defender. Nós vamos continuar fazendo o que
já fazemos há muito tempo, a inclusão da comunidade através da CUFA. Trazendo os
problemas para discussão.

QUAL A CONCLUSÃO QUE TIVERAM DESSA EXPERIÊNCIA?

MB - Não é caso de polícia, de Justiça. É caso de educação, cultura, oportunidade, igualdade. Nas viagens dos shows tive a sensação de que havia mais de dois brasis. E nós estávamos lidando com os mais descuidados. A realidade do Rio é compartilhada no Brasil inteiro. Quando fiz um show em Minas Gerais, teve um tiroteio com três mortos. Dois de uma comunidade e um de outra. O jornal sequer noticiou. Mas os jornais noticiam um tiroteio em Ipanema sem nenhum ferido. Esse projeto é uma oportunidade de mostrar a vida sendo banalizada. Vimos em todas as nossas cidades os meninos encontrando no tráfico de drogas o caminho para sobreviver. Isso está acontecendo com garotos das periferias de cidades como Porto Alegre e Curitiba.

COMO MUDAR ESSA REALIDADE?

MB - Não devemos responsabilizar governos. Não é algo de agora, não é culpa do governo atual. Mas essa é a oportunidade para brecar. Acabar é impossível. Nem os EUA conseguiram. Temos que combater a falta de educação, de saúde, de cultura, de conhecimento, de oportunidade. Esse é o momento de todos fazerem uma reflexão para saber onde está indo o Brasil. Se eu fosse o general de um grande exército faria uma grande invasão nas favelas do Brasil. Mas não da forma tradicional. Eu invadiria com as armas da saúde, da educação, da cultura, do conhecimento, da oportunidade, da visibilidade, do desenvolvimento. Essa
experiência me mostrou que essas são as armas para combater melhor a violência.”

Fonte: Agência Carta
Maior

Creio que a letra da música abaixo, embasa tudo o que foi dito anteriormente:

SOLDADO DO MORRO
Composição: MV BILL

Minha condição é sinistra não posso dar rolé
Não posso ficar de bobeira na pista
Na vida que eu levo eu não posso brincar

Eu carrego uma nove e uma hk
Pra minha segurança e tranqüilidade do morro
Se pa se pam eu sou mais um soldado morto
Vinte e quatro horas de tensão
Ligado na policia bolado com os alemão
Disposição cem por cento até o osso
Tem mais um pente lotado no meu bolso
Qualquer roupa agora eu posso comprar
Tem um monte de cachorra querendo me dar
De olho grande no dinheiro esquecem do perigo
A moda por aqui é ser mulher de bandido
Sem sucesso mantendo o olho aberto
Quebraram mais um otário querendo ser esperto
Essa porra me persegue até o fim
Nesse momento minha coroa ta orando por mim
É assim demorou já é
Roubaram minha alma mas não levaram minha fé
Não consigo me olhar no espelho
Sou combatente coração vermelho
Minha mina de fé ta em casa com o meu menor
Agora posso dar do bom e melhor
Varias vezes me senti menos homem
Desempregado meu moleque com fome É muito fácil vir aqui me criticar

A sociedade me criou agora manda me matar

Me condenar e morrer na prisão
Virar noticia de televisão
Seria diferente se eu fosse mauricinho
Criado a sustagem e leite ninho
Colégio particular depois faculdade
Não, não é essa minha realidade
Sou caboquinho comum com sangue no olho
Com ódio na veia soldado do morro

Feio e esperto com uma cara de mal
A sociedade me criou mais um marginal

Eu tenho uma nove e uma hk

Com ódio na veia pronto para atirar

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